A pessoa pode enquanto está vivendo não estar dando o sentido ao que está acontecendo.
A ligação de sentido.
Ela está percebendo o que se passa, mas é uma espécie de objeto da situação.
Um operário da situação.
Cumpre ordens, atende ao que é pedido, e também faz, é agente do que deseja, também faz aquilo que quer, faz o jogo.
Estando na situação como um parceiro, um membro da família, numa empresa, um funcionário de um setor... Tem um livro bom sobre isso chamado A Inveja na Organização.
Cada pessoa está observando o que está se passando, quem viaja, quem é mais bem recebido pelo chefe, quem tem mais bom relacionamento, quem é mais sisudo, quem trabalha mais, quem não falta nunca, quem vive trazendo justificativa e é perdoado por faltar ao trabalho.
Isso é percebido e vai ficando registrado e a pessoa vai sentindo as consequências. Quando se sente preterido. A inveja na organização é histórica, não é novidade.
O que estou colocando nesse breve áudio relaciona também ao que eu venho escrevendo no livro de filosofia porque o livro está pretendendo tratar o inconsciente de modo diferente do que propôs o Freud.
O inconsciente Narcísico seria essa situação que a pessoa está vivendo ambiente onde ela gere a situação mas também é gerida, de certo modo ela é atendida, porque senão, ela não ficaria ali, ela denunciaria tudo... Ela não é somente vítima da situação, ela também é agente naquela situação, é sujeito, mesmo que seja um sujeito assujeitado.
Daquilo que ele está realizando que atende ao que ele quer, ele vai para a frente. Há uma ruptura, há um bloqueio, há um problema enorme, quando percebe que foi passado para trás. Num determinado instante, percebe que um jogo fez ele ficar para trás, ele, ela, quem quer que seja.
Por exemplo, numa empresa, uma pessoa é demitida bruscamente. Nesses casos de redução de quadro de pessoal era um horror. Por exemplo, na Vale do Rio Doce quando uma pessoa era escolhida, porque tinha que tirar um num setor de dez, 10%, vamos dizer, e como escolher uma pessoa das dez? A pessoa demitida sempre aceita, porque a empresa tem o direito de demitir quem ela quiser, a hora que ela quiser, o salário é pago, tem um contrato social de trabalho.
E num casamento, quando alguém trabalhou vinte e cinco, trinta anos, e é devolvido para a casa do pai, por exemplo, porque não tem renda, ou é dispensado porque não rende mais o suficiente, ou começou a perceber que fuma... aí, começa a neurose doméstica.
Porque o amor supõe perdão, olhar o positivo e deixar o negativo, o padre diz na igreja: o pacote completo. Você está levando a noiva e o noivo, cada um com todos os seus dramas, que muitas vezes vai descobrir depois na cama, no ambiente doméstico, na convivência...
Tolera-se tudo, menos, quando a pessoa é esmagada demais, é totalmente traída, enganada...
Eu comecei o áudio dizendo que nessa situação a pessoa vai vivendo sem ligar completamente os fatos, e ela só vai ligar depois, quando um sentido novo fecha.
Isso é o Saussure, é a linguagem, a linguística, o sentido vai caminhando com o texto e vai fechando parágrafo por parágrafo, frase por frase, capítulo por capítulo, o sentido vai navegando junto com o texto igual num filme.
Vai caminhando, caminhando, e PUFT!, tem o final, uma surpresa. Alguns diretores de cinema botam uma coisa bizarra no fim (não era no filme melancolia, mas em O Homem Duplicado), que no fim tem uma aranha gigante. Ou então no filme Psicose, que tem o filho segurando o cadáver da mãe no colo.
Então, um filme tem necessariamente que caminhar para um fim, mas a vida não, a vida é uma coisa aberta, vai sendo ressignificada. Tem algumas pessoas que após sair de um casamento se tornam andarilhas, se tornam perdidas, ficam quatro ou cinco anos, tanto o homem como a mulher.
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